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TJGO - Tribunal de Justiça do Estado de Goiás

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UMA HOMENAGEM A RIO VERDE

quarta-feira, 16 de março de 2011


Por Renato Nalini
Renato Nalini
São 17.852 os bacharéis inscritos para o 183.º Concurso de Ingresso à Magistratura ora em curso no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP). Disputam 193 vagas já existentes e as que vierem a ser abertas no decorrer do certame. A Corte estadual é a maior das Américas: o quadro de 360 desembargadores é complementado por mais 2.160 magistrados em atuação na primeira instância.
Não se dispõe de informações que noticiem número de inscritos superior a esse, em outros concursos da magistratura que se realizam Brasil afora. E os interessados acorreram simplesmente porque tomaram conhecimento do edital de abertura do certame nos sites oficiais do TJ-SP e da Vunesp, instituição encarregada da operacionalidade da seleção.
Houve total desinteresse da grande mídia em noticiar esse concurso. Afinal, é mais um no imenso rol dos processos seletivos para recrutar servidores públicos num Brasil cuja máquina estatal cresce como nunca antes se viu neste país.
Prover a magistratura de quadros adequados é, para a mídia, tema irrelevante. Sempre atenta aos deslizes de qualquer juiz, ávida por divulgar o folclore judicial, as mazelas que não poderiam deixar de acometer o Judiciário, instituição humana e, portanto, falível, não considera sua missão contribuir para aprimorar essa prestação estatal.
Não interessa divulgar que o concurso promovido pelo Estado de São Paulo é o primeiro que se ajusta à Resolução n.º 75, de 12/5/2009, editada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). É a maior Justiça do Brasil a adotar a normatividade cogente expedida pelo segundo órgão do Judiciário, aquele denominado de “controle externo” da magistratura. CNJ que reconheceu, depois de décadas de críticas externas e mea culpa endógeno, que nenhuma emenda à Constituição, nem a mais pretensiosa legislação, transformaria a Justiça no serviço público eficiente e efetivo como tem direito a sonhar aquele que anseia por um novo Brasil.
A chave de conversão da Justiça em universo afinado com a contemporaneidade é o recrutamento e o preparo de magistrados. A melhor lei é insuscetível de modificar a sociedade, se não for aplicada por uma consciência reta. Consciência de quem assume a condição de agente de transformação da sociedade. Igualmente responsável – assim como os demais que exercem funções estatais – a edificar uma Pátria justa, fraterna e solidária.
Foi por reconhecer que os concursos públicos até então realizados priorizavam a capacidade mnemônica do candidato, mas não conseguiam detectar – ao menos com a eficiência desejável – outros atributos mais importantes do que a erudição, que o CNJ regulamentou o procedimento e os critérios relacionados à seleção de novos juízes.
Pode parecer pouco, se considerada a metodologia de provimento do quinto constitucional e o acesso aos tribunais superiores, cujos critérios a mídia conhece mais do que os juízes, envolvidos num exponencial crescimento da demanda. Mas o concurso é a porta de entrada natural para quem quer fazer carreira de juiz. É o destino do vocacionado, aquele que não perdeu ainda a esperança de realizar o justo concreto.
É por isso que o concurso hoje é um desafio à praxe estabelecida há tantos anos e que favoreceu a multiplicação de cursos de preparação. A previsibilidade da sistemática impôs aos concurseiros a façanha de decorar todo o universo da legislação, doutrina e jurisprudência. Missão hercúlea para a prolífica produção jurídica brasileira. Com descuido das noções gerais de Direito e formação humanística, por todos consideradas “perfumaria” desnecessária.
Hoje, o futuro juiz precisa ter noções de Sociologia do Direito e, principalmente, de Administração Judiciária. Não poderá desconhecer aspectos gerenciais da atividade judiciária, com administração e economia. Não se esqueceu o produtor da norma de exigir gestão e gestão de pessoas. O magistrado precisa estar atento às transformações sociais, conhecer comunicação social e a opinião pública. Debruçar-se sobre os mecanismos de resolução, assumindo como tarefa sua estimular os sistemas não judiciais de composição de litígios.
Em Psicologia Judiciária, pretende-se fazer o candidato se interessar por relacionamento interpessoal, assédio moral e assédio sexual. Mas o ponto central é imergir na ética, para que o futuro juiz não alegue desconhecimento dos deveres funcionais da magistratura nem do Código de Ética da Magistratura Nacional. O consequencialismo entra aí: ninguém pode decidir tecnicamente e se desinteressar pelo resultado de sua decisão no mundo concreto.
Filosofia do Direito é também essencial para apreender os conceitos de justiça e de equidade, e novamente se introjetar da conexão íntima entre Direito e moral. Enfim, quebraram-se os paradigmas da memorização pura e simples, rumo à tentativa de se proceder a uma revolução judiciária da qual a nacionalidade colherá os frutos ao longo do tempo.
O CNJ exerceu a sua função de aprimorar o Judiciário e o Tribunal de Justiça de São Paulo se propõe a adequar-se à normativa, com adequação à realidade singular desta unidade da Federação. Será que em qualquer outro Estado há concurso cujo interesse resulte em concreta inscrição de quase 18 mil concorrentes?
Tudo isso não faz parte do interesse da grande mídia. Os espaços são destinados às páginas inteiras de publicidade, com destaque para a consolidação da era automobilística. O carro é muito mais importante do que as pessoas.
A irrelevância do tema não impediu que o Tribunal de Justiça bandeirante, no exato cumprimento de seu dever, procurasse acertar o passo com as legítimas exigências do povo, que ainda enxerga no Judiciário a derradeira esperança de ver restaurado o seu direito lesado. Se vier a lograr algum êxito, as futuras gerações o sentirão e isso é o verdadeiramente relevante na árdua, frustrante e, mesmo assim, urgente reconstrução da democracia.
O autor é Desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo. Docente universitário. Membro da Academia Paulista de Letras. Autor, entre outros, de Ética da Magistratura (2ª ed.), A Rebelião da Toga (2ª ed.) e Ética Ambiental (2ª ed.).
Artigo publicado originariamente no site http://renatonalini.wordpress.com/ em 13/03/2011.

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