Por Ricardo Geraldo Rezende Silveira
A principal reclamação acerca da atuação do Poder Judiciário diz respeito à excessiva demora na definição dos processos. A ideia comum é a de que os processos judiciais duram anos e, quando se chega finalmente a uma sentença de mérito, os recursos levam ainda mais adiante a solução das controvérsias. Essa constatação — que não deixa de ser verdadeira — sobre quanto tempo dura um processo muitas vezes não vem acompanhada de ponderações sobre o exercício da jurisdição estatal. Tão importante quanto o tempo que dura é deixar claro o tempo que pode durar e o tempo que deve durar um processo judicial.
A Constituição Federal trouxe previsão inovadora no inciso LXXVIII, do artigo 5º, estabelecendo como direito fundamental do cidadão o da razoável duração do processo. A redação do dispositivo é perfeita, pois a garantia constitucional não é de um processo rápido, mas sim de um processo com tempo razoável de duração. Qual seria então esse tempo razoável? Somente uma análise casuística e pontual poderia responder a tal questionamento.
O importante, no entanto, é ser honesto em relação ao exercício de tão relevante função do poder estatal. A justiça para ontem, tal qual a justiça tardia, se aproxima da injustiça manifesta. Nesta época de veneração dos números, divulgam-se a todo instante dados sobre a quantidade de processos julgados, mas nunca se vê um mínimo de preocupação com a qualidade das decisões proferidas. A enaltecida Meta 2 do Conselho Nacional de Justiça — que determina a identificação dos processos judiciais mais antigos e o julgamento de todos os distribuídos até 31 de dezembro de 2005 — não menciona uma linha sequer sobre o conteúdo das milhares de sentenças que deveriam ser produzidas.
Na contramão da adoração dos números está o descrédito e a desqualificação dos magistrados criteriosos e preocupados com os casos concretos. Esse juiz que efetivamente julga o processo é vítima de pressão e desconfiança, pois não consegue produzir montanhas de sentenças como querem os responsáveis pelas políticas judiciárias.
O fato é que a conta não fecha! Ou o juiz faz boas sentenças ou faz muitas sentenças. Não é possível que um magistrado produza centenas de decisões em um único mês. Pode-se objetar que várias delas tratam de matérias repetitivas, mas quem deve dizer se o caso se adéqua a essa situação é o próprio juiz, e isso não tem acontecido. Cria-se, então, um hiato entre o órgão constitucional responsável por exercer o poder jurisdicional e o real exercício desse poder por terceiros não legitimados a tal atividade.
É preciso pensar se queremos a qualquer custo um processo rápido ou se a solução dos problemas do Judiciário passa também por um processo justo e por uma real prestação jurisdicional. A Suprema Corte Americana, com seus nove ministros, julga cerca de 100 processos por ano, enquanto cada um dos 11 ministros do nosso Supremo Tribunal Federal recebe, em média, 10 mil processos todo ano, o que não torna os juízes americanos ineficientes. De outro lado, enquanto na Alemanha há um juiz para cada três mil habitantes, no Brasil temos um para cada 24 mil habitantes.
Ricardo Geraldo Rezende Silveira é juiz federal e presidente da Ajufesp (Associação dos Juízes Federais de São Paulo e Mato Grosso do Sul).
Artigo publicado originariamente na Revista Consultor Jurídico, 18 de agosto de 2011
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